Pérolas da Minha Infância e Juventude (Blog N. 528 do Painel do Coronel Paim) - Jornal O Porta-Voz

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

DOM AQUINO CORRÊA (Do Blog do Antonio Miranda)


D. Aquino Correia (nome civil: Francisco A. C.), sacerdote, prelado, arcebispo de Cuiabá, poeta e orador sacro, nasceu em Cuiabá, MG, em 2 de abril de 1885, e faleceu em São Paulo, SP, em 22 de março de 1956. Eleito em 9 de dezembro de 1926 para a Cadeira n. 34, na sucessão de Lauro Müller, foi recebido em 30 de novembro de 1927, pelo acadêmico Ataulfo de Paiva.

Era filho do casal Antônio Tomás de Aquino e Maria de Aleluia Guadie-Ley Correia. Cedo revelou sua inteligência, amor aos estudos e vocação religiosa. Iniciou os estudos no Colégio São Sebastião e fez o curso no Seminário da Conceição. Depois passou a freqüentar o Liceu Salesiano de São Gonçalo, onde recebeu o grau de bacharel em humanidades. Em 1902 ingressou no Noviciado dos Padres Salesianos de D. Bosco em Cuiabá, ordenando-se sacerdote em 1903 e iniciando o curso de Filosofia. Em 1904 seguiu para Roma, onde matriculou-se, simultaneamente, na Universidade Gregoriana e na Academia São Tomás de Aquino, por onde haveria de doutorar-se em Teologia, em 1908. Em 17 de janeiro de 1909, já tendo recebido todas as Ordens Menores e Maiores, foi ordenado presbítero.

De volta ao Brasil, foi nomeado diretor do Liceu Salesiano de Cuiabá, cargo que desempenhou até 1914, quando foi designado, por SS. Pio X, para titular do Bispado de Prusíade e Auxiliar do Arcebispo da Diocese de Cuiabá, cargo em que foi investido em 1o de janeiro de 1915, aos 29 anos, sendo, então, o mais moço entre todos os bispos do mundo.

Em 1919, o papa Bento XV conferiu-lhe os títulos de Assistente do Sólio Pontifício e Conde Palatino. Em 1921, com o falecimento do Arcebispo Dom Carlos Luís de Amour, foi elevado ao Arcebispado de Cuiabá, recebendo o Pálio Arcepiscopal das mãos de Dom Duarte Leopoldo e Silva, arcebispo de São Paulo. Em 1917, indicado pelo governo de Venceslau Brás como elemento conciliador, fora eleito governador do seu Estado para o período de 1918-1922. Ali se manteve à altura de sua consciência democrática, de sua capacidade construtiva e de seu profundo sentimento patriótico. Amparou a cultura regional, tomando a iniciativa de fundar a Academia Mato-grossense de Letras onde, depois, como titular, seria aclamado por unanimidade Presidente de Honra. Criou também o Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso, do qual foi eleito Presidente Perpétuo.

Autor de inúmeras e notáveis Cartas pastorais, de discursos, trabalhos históricos e poesias, D. Aquino Correia publicou Odes, o seu primeiro livro de versos, em 1917, seguido de Terra natal, onde reuniu poemas de exaltação a Mato Grosso e ao Brasil, cheios de suave lirismo e fascínio pelo seu torrão.

"Há, na poesia de D. Aquino disse o embaixador e acadêmico José Carlos de Macedo Soares um forte lirismo que combina bem com o seu poder descritivo, não só quando ele narra um episódio, como também quando invoca uma paisagem ou simplesmente uma viva emoção."

Mais tarde deu a público alguns trabalhos em prosa. O escritor escorreito está em todas essas páginas, tantas delas revelando o interesse de D. Aquino pelas coisas nacionais.


O seu domínio na tribuna pública era absoluto. Não só como orador sacro era admirado, senão também na tribuna das conferências, como o confirmou, em várias entidades culturais. Destacam-se a conferência magnífica sobre o "Centenário do Bispado de Cuiabá", proferida no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, onde foi recebido em 1926; a "Mensagem aos homens de letras", proferida na Academia Brasileira de Letras; "A verdade da Eucaristia", oração inaugural do V Congresso Eucarístico de Porto Alegre, em 28 de outubro de 1948.

Obras: Odes, poesia, 2 vols. (1917); Terra natal, poesia (1920); A flor d’aleluia, poesia (1926); Discursos, oratória (1927); O Brasil novo, discurso (1932); Castro Alves e os moços, discurso (1933); Oração aos soldados, discurso (1937); O Padre Antônio Vieira, discurso (s.d.); Nova et vetera, poesia (1947); cartas pastorais, ensaios e conferências publicadas na imprensa do país, não reunidas em livro. Escreveu ainda obras de geografia e história: A fronteira de Mato Grosso Goiás, memória sobre os limites entre os dois estados, e o Brasil em Genebra (1919).

Gentileza Academia Brasileira de Letras www.academia.org.br, transcrito em:
http://www.biblio.com.br/conteudo/biografias/domaquinocorreia.htm

Poema extraído da obra CHUVA DE POESIAS, CORES E NOTAS NO BRASIL CENTRAL, 2 ed., de Sônia Ferreira. Goiânia:Editora da UCG; Editora Kelps, 2007, com a autorização da autora.


DEUS!

Quem fez, ó minha alma, estas verdes campinas,
Quem fez a bonina, quem fez estes céus?
Quem fez nestas vargens as lindas palmeiras,
Louçãs e altaneiras, quem foi, senão Deus?

Quem fez esses astros que brilham nos ares,
Quem fez dos luares os fúlgidos véus?
Quem fez essas aves gazis e canoras,
Quem fez as auroras, oh! quem, senão Deus?

Quem fez esse plácido olhar do inocente
Que fala, eloqüente, até mesmo aos incréus?
Quem fez o sorriso das mães carinhosas,
Melhor do que as rosas, quem foi, senão Deus?

Quem foi que te deu, com a fé e a esperança,
O amor, essa herança negada aos ateus?
Oh! quem contará outras dádivas santas,
Tão ricas e tantas, que houveste de Deus?

São mais, muito mais que as infindas estrelas,
Que orvalham, tão belas, o azul destes céus;
São mais do que as flores gentis desta terra,
Que, entanto, as encerra infinitas, meu Deus!

Quem, pois, ó minha alma, tem tantos direitos
Aos férvidos preitos dos cânticos teus?
A quem votarás dos teus santos amores
As místicas flores; a quem? só a Deus!


AS LAVRAS DO SUTIL

Antemanhã, quando no céu de leste,
Mal se esgarçava em luz a noite mansa,
Miguel Sutil de Sorocaba avança,
Rumo ao mistério do sertão agreste.

Estrada longa e atroz! Mas ele a investe,
Com redobrado heroísmo, e não se cansa.
Vão-lhe à frente dois índios, e a Esperança
Visões de ouro não há, que não lhe empreste.

E  ei-los que chegam a estes sítios belos,
Onde o outro excede todos os castelos,
Do sonho audaz do bandeirante. Lá,

Ao longe, em praias verdes e desertas,
Faiscava o rio...  Estavam descobertas
As minas imortais do Cuiabá.


CORUMBÁ

Qual outrora, ao mirífico arrepio
Da onda azul do mar Jonio, a deusa Venus,
Assim nasceste, sob os céus serenos,
À flor do lindo pantanal bravio.

Tão bela é tu, que o teu selvagem rio,
Ao morder estes céspedes amenos,
Dá longas voltas por que possa, ao menos,
Contemplar teu mimoso casario.

E uma vez ele viu (hórrido agouro!)
Ai! Viu-te, como Andrômeda no oceano,
Amarrada a este escolho negro e duro.

Mas tu, calçando-te os talares de ouro
De Mercúrio, largaste o vôo ufano,
Para este azul glorioso do futuro!


RIO ARAGUAIA

Rio que rolas majestosamente,
Sobre diamantes, na itaipava hirsuta!
Não mais te abala, na selvagem luta,
Do bravo Ubirajara o grito horrente!

Não mais, à flor da lânguida corrente,
Por onde o boto espalma a cauda bruta,
Não mais o silvo do vapor se escuta,
Ondeando, além, na praia alvinitente!

Não mais! Não mais! Silêncio... a tarde finda,
E as onda beijam os destroços vagos
De velhas naus, numa elegia infinda...

Mas do teu fado nos castelos magos,
A Glória dorme, com dorme ainda
A pérola na concha dos teus lagos!


         Terra Natal. 2ª. ed. 1922

“INDEPENDÊNCIA OU MORTE”


                       À “Brigada Branca” dos Colégios Salesianos


Foi sobre a tarde, quando o sol declina,
Hora divina das contemplações,
Hora do Gólgota, sublime hora,
Marcada outrora para as redenções.

Deus decretara redimir a terra,
Que o nome encerra da sagrada Cruz,
E a um jovem príncipe entregou a espada
Dessa cruzada de infinita luz.

O herói passava, em seu ginete airoso,
Ao sol radioso, que esmaltava os céus:
O ideal fremia-lhe na fronte inquieta,
Era a silhueta de um estranho deus!

Tinha a seus pés, por pedestal, o outeiro
Alvissareiro do Ipiranga em flor;
E a brisa e as árvores e a onda flava,
Tudo cantava de esperança e amor!

E quando ergueu aquele sabre de ouro,
E como estouro de vulcão fatal,
Rugiu nos céus: “Independência ou Morte”
Tinha no porte, um heroísmo ideal!

Responde ao grito, e, delirante, brada
A cavalgada, que nos fez nação;
E o luso tope, que algemava os braços,
Rola em pedaços no brasílio chão!

Entanto o grito: “Independência ou Morte!”
De sul a norte, num fulmíneo ecoar,
Livres bandeiras pelo azul desata,
Numa fragata lá transpõe o mar!

Desde o Itatiaia, que assoberba os ares,
Até Palmares, repercute a voz:
Ouvem-na os manes dos fatais guerreiros,
Dias, Negreiros e Poti feroz.

Sorri-lhe o espírito imortal de Anchieta,
Anjo e poeta, que o Senhor nos deu;
E, do além túmulo, como que suspira
A infausta lira do gentil Dirceu.

Brota de tudo, e se ouve um hino ardente,
Ardentemente, pelo azul cantar,
Um como hino de Natal que erra,
Do céu à terra, e da montanha ao mar!

E qual Andrômeda, sorrindo agora,
A voz canora do novel Perseu,
Tal surge a Pátria do Cruzeiro lindo,
Livre, sorrindo, para o azul do céu!

Sublime grito: “Independência ou Morte!”
Que o jugo forte do opressor destróis!
Da liberdade és o fatal dilema,
O eterno lema de um país de heróis!

Não és o grito da anarquia infame,
Que espuma e brame, contra Deus e o rei;
Tu és o cântico da liberdade,
Que não evade os muralhões da lei!

Tu és um raio dessa Cruz bendita,
Que além palpita, em nossos puros céus;
És o diadema de uma Pátria ingente,
Que, livre e crente, só se humilha a Deus!

                                               1917

Página republicada em fevereiro de 2008